segunda-feira, 30 de maio de 2011

"Passadeira Vermelha"

Sentada nesta praia de sonho recordo-me do teu sorriso. Parecia transmitir tanto amor que julguei ter-te para sempre. Entraste assim de rompante na minha vida, numa altura que tudo parecia correr bem. Hoje pergunto-me se apareceste por estares convencido que irias desfrutar para sempre de uma passadeira vermelha. A vida corria-me sem sobressaltos, julguei que ela me resolvera presentear com um amor incondicional.

Não te esperava, acho que nunca esperamos o melhor de nós. Habituada a viver tranquila, sem essa pressão de tantos, em perseguir um sonho cor-de-rosa, apenas vivia essa rotina normal de um dia a dia calmo sem brilho.

Aos poucos entreguei-me sem muita resistência àquilo que julguei ser um tempo de mimo, sem data marcada para conversas sérias. Estranhei essa tua urgência de buscar palavras e definições certas para os nossos momentos.

O meu desejo era apenas usufruir dessa pausa de menina guerreira, papel que me habituei a desempenhar desde criança. Aninhada no teu colo nessas manhas soalheiras de domingo, aprendi a respirar fundo, a dar-me ao luxo de deixar escapar uma lágrima antiga, um suspiro retido.

Contigo vivi todos esses estados de espírito que só o amor, embrulhado nessa paixão ardente permite. Voltei a experimentar esse desejo de adolescente, na urgência de chegar aos teus braços. Tantos anos depois e tantas juras a mim mesma que esse barco sem destino certo não voltaria a embarcar.

Essa tua persistência em fazer-me crer no teu amor incondicional deveria ter-me alertado, para experiências anteriores, mas cansada dessa luta de guerreira, perdi-me dos meus sentidos, desliguei as antenas, e fui assim deixando-me embalar nessa tua história de fadas.

Tudo para mim era uma verdadeira alegria, desde o pequeno-almoço servido na cama com esse teu ar de chefe, a flor comprada ao indiano, que sempre achei uma parolada, enfim!

Foste assim insistindo nessa história de amor incondicional, e eu fui-me desprendendo das minhas eternas defesas, sei que te trouxe facilidades. Que porventura achaste que pelo embrulho exterior tudo seria caminho sem curvas, sem tormentas e cheio de facilidades.

Estranhei o teu franzir de sobrolho à primeira dificuldade, a tua estranheza e o teu recuo.

Hoje sei que a tua história era apenas mais uma, que navegas numa passadeira vermelha com mais que um patrocínio, pois assim foste cedendo aos apelos familiares, que te prometeram mais ajuda e presença.

Assim fui descobrindo nas palavras que ficaram por dizer, que essa tua queda por passadeiras vermelhas é inata em ti, pois gostas mesmo é de ter essa vida que cresceste a cobiçar de alguns!

Eu cá fico com a minha verdade!

Odeio vermelho!


Maria Sá Carneiro

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Nada!

Aqui no meio do nada vezes nada, tento entender a gigantesca e brutal carência que se me cola, a que tantos chamam solidão. Anos e anos que procuro em mim, explicar-me que quer dizer essa dita cuja solidão. Pensamentos de horas corridas e enrodilhadas em direcção pouco assertiva e errónea. Solidão é apenas um chavão pesado e penoso! Talvez o que realmente me dói é essa falta de mimo e de sentir protecção. Um colo no qual eu possa mergulhar e sentir esse cheiro, mescla de perfume machão e de pele curtida pela vida.
Um abraço, um regaço, um porto seguro, ou apenas um gesto de compreensão, uma luz, uma ideia, uma festa, uma esperança!
Uma saída que já nem precisa de ser airosa, mas uma luz. Vivemos nessa corrida batoteira à procura de holofotes, quando apenas nos basta uma vela quente e firme.
Esse desespero acumulado que me leva a escrever linhas sem sentido, em versos de folhetos desta sociedade de promoção em promoção na verdadeira despromoção do ser humano.
Essas vozes que te apelidam de nomes de família outrora famosos, essa gente que te julga, quando já nem sequer podes pôr um cego a cantar.
Essa multidão desumana que só clama com o que lucra, e pior que tudo isso, esse passado que não te larga, essas armadilhas, cordeiros verdadeiramente disfarçados, quando apenas são lobos, sanguessugas que te querem ver lá no fundo.
Apenas porque és genuinamente tu!
Seja isso bom ou mau, para ti é verdade.
Atordoada pelo teu próprio desespero, vais assim cavando o teu buraco onde jamais a terra te cobrirá, pois em cinzas queres te tornar.
Em nada vezes nada, mas não mais nessa agonia de olhar e nada ver. Estender a mão e em nada tocar. Chorar lágrimas grossas que caiem em saco roto!
É como se fosses outra vez e repetidamente, vezes sem conta, essa criança naquela noite tenebrosa de trovoada, apenas abafada pela discussão do quarto ao lado.
Assim te vais entregando um bocadinho mais todos os dias à espera do dia que nunca chegará.
Frases que foram ficando gravadas e tatuadas em ti para sempre. Frases que levas tempos infinitos a digerir, sem que nunca as conseguir sequer processar. Essa maldade que não consegues aprender, vai assim acabando contigo.
Continuas a ter essa esperança de criançola, que essas pessoas vão estar aí para ti, como tu estarás sempre para elas, esquecendo essas maldades que te foram lançando como se de mau-olhado se tratasse.
Essa generosidade de estar sempre à mão de semear, criou-te esse fosso ente ti e tu. Baralhaste fronteiras e territórios, assim as tuas cinzas ficarão na terra de ninguém.
Porque foi nisso que te fostes tornando, em ninguém, em nada vezes nada!

Maria Sá Carneiro