segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Choro

Choro sem entender essa saudade que se em mim se instalou, Corre por mim dentro um arrepio, uma lamúria, uma angústia. Assim nessa ilha de solidão, desespero por uma mão amiga, um ombro. Algum sussurro de conforto, uma esperança, uma luz.

Dias e dias que se arrastam por mim, nada muda, nada melhora, nada já espero, senão já com alguma tranquilidade a hora da partida. Hesito e balanço se a force a chegar, ou se continue aqui nesta ilha de nada e de ninguém, à espera.

Penso algumas vezes que vais abrir aquela porta, com esses olhos marotos e brilhantes, chegando assim como nunca me tivesses abandonado, perguntado como dantes, o que eu queria jantar.

Não tenho saudades desses tempos brilhantes, repletos de companhias, a maioria das quais nunca cheguei sequer a gostar, tenho saudades de ter paz, amor e compreensão.

Nunca se quer me passou pela cabeça, chegar assim a esta idade sem ter essa segurança, paz e o teu amor. Hesito, balanço, caio, desentendo-me de mim, desintegro-me.

Choro por ti, pela saudade desse cheiro doce e colo seguro. Anseio por essa lareira que tanto nos uniu, esse abraço fechado.

Tentei ir lutando, rindo e tocando a vida para a frente, mas a vida foi-se esbatendo em mim, a alegria foi partindo de mim, as companhias desapareceram com ela.

Choro aqui no nosso lugar de sempre, por ti, por nós, e espero a minha hora.

Maria

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Estranha forma de vida

Escrevo-te hoje assim como se fosse a última vez, nesse último suspiro, nesse último esforço de me abeirar de ti. Os anos foram passando, a tua imagem esbateu-se na minha memória, essa estranha forma de vida moderna, em que nos afogamos em tudo e em nada.

Busco nas minhas recordações de outrora essas nossas arrelias tão longínquas e tão alegres. Travessuras de criança irrequieta assaltavam essa tranquilidade desse relvado verde, com rosas de Santa Teresinha por todo lado.

Eu nesse baloiço de sempre, arranhada, suja de terra, na esperança que reparasses em mim, à espera de um ralhete, um olhar, uma crítica ou apenas um sorriso.

Modelos entranhados nas nossas memórias, bandeiras hasteadas que no fundo não são nem nunca serão as nossas, gritos de independência pela dor da dependência, desse porto seguro. Soutiens em riste, lábio mordido, coração amarfanhado, “mais vale só que mal acompanhado”.

Navego nesse labirinto da vida em que embarquei sem consciência, procuro por ti, por ele, e por outros que tomei como meus erroneamente.

Promessas e ilusões das quais só eu sou responsável, por não me saber aceitar, refazer ou reinventar.

Essa dor que por vezes já não suporto, não tem melhoras, por falta de esperança, como se a vida dependesse dum hipotético final apoteótico de um concurso de “vacas cornélias”.

Nesse nó cego de mim prossigo nessa fuga ridícula para sítio algum, deito-me no silêncio da noite, imaginando que também vou partir, e reencontrar-te num abraço fechado, demorado, e acima de tudo verdadeiro!

Outras vezes tento reparar naquilo em que me tornei, se haveria algum ponto, por mais minúsculo que fosse, que conseguiria arrancar-te uma palavra breve de reconhecimento, um rasgo de alegria, ou mais uma vez apenas um sorriso.

Estranha forma de vida, ou apenas viramos estranhos de nós próprios, nessa ponte sem união possível entre a nossa infância e esse mundo de hoje.

Saudades! Sempre!


Maria Sá Carneiro