domingo, 30 de janeiro de 2011

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

"Estórias"

Cansada desse teu ar reprovador, dessa critica velada, àquilo que chamas delírios de mulher, resolvo de vez partir. Farta desse olhar por cima do ombro, cada vez que estamos à luz do dia, para a minha anunciada casca de laranja, decido calçar uns patins, assim te referes aos teus brilhantes coleguinhas de trabalho que trocam as suas mulheres pelas esguias e parvas secretárias.

Tantos projectos em comum, conversas noite dentro, nos braços um do outro, promessas que nem a celulite nos afastaria.

Por vezes pergunto-me se te vês ao espelho, com essa testa que mais parece um aeroporto, com a barriga meia assim cai que não cai? Apesar desses teus heróicos esforços de seres um atleta tardio e suado que nem um porco.

Parto logo que vejo uns raios de luz, levo o carro tão anunciado como meu, mas tão cobrado como teu, deixo-te assim como cobrança desses anos acumulados de esforços para nos manter à tona da água.

Pego nos meus tarecos e deixo-te de recordação as belas prendas doiradas que tão generosamente me ofereceste como prémio de eu ter fingido que não sentia esse cheiro repugnante das tuas chegadas de madrugada, de reuniões de trabalho em quartos de motéis cidade fora, entre perfume franziu/sovaco.

Imagino o teu olhar indignado de quem hesita em respirar aliviado, e preocupado no que vai dizer aos seus preciosos círculos de amigos e família.

Será que vais contar a verdade?

Qual verdade?

Que parti de um nós que só existiu mesmo em boas intenções da minha parte, que parti para ser livre em mim, e não para me livrar de um tipo cheio de presunção, que precisa de se afirmar pelo exercício de montar tudo o que mexe, e pelo dinheiro que consegue demonstrar ter.

Tanta mágoa e crítica despejaste em mim por eu não puder ter filhos. Tanto sofrimento engoli aos baldes por não ser capaz de te dar uma fila de crianças a quem, hoje, tenho a certeza que nem o ranho limparias!

Vou assim devagar, sorridente, parto de um eu imposto e fabricado para bem servir, quem jamais o mereceu.

Sim eu sei que não tenho preparação para esses mercados virtuais e exigentes, que te moves como uma enguia, mas vou abraçar esse meu projecto de ser livre e verdadeira.

Maria Sá Carneiro

sábado, 22 de janeiro de 2011

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Apenas!

Busco palavras encantadas para te cantar!

Reconheço que não te sei cantar essas palavras doces, mas quero levar-te ao luar do nosso jardim secreto e murmurar-tas ao ouvido, assim devagar. Quero escutar o brilho da tua alma, dar-te esse abraço fechado e quente, de quem está assim tão simplesmente ao meu lado. Apenas por me apreciar. Apenas por me admirar, e me considerar.

Contigo recordei o que é alguém gostar de nós como seres humanos.

Contigo tenho viajado nesse regresso às boas recordações. Conversas secretas de pequenas inconfidências do passado, pormenores apenas apreciados por quem saber ouvir com paixão de vida.

Assim como velhos sentados em banco de jardim, planeamos loucuras fora de época, traquinices de meninice, nessas incursões com brilho verde-mar!

Esse alento que me transmites nesse sorriso rasgado como realmente eu fosse assim tão especial, que te torna especial e essencial.

Queria acordar com voz bonita e poderosa para te cantar, músicas cheias de conteúdo, ricas nesse sentimento que me mantém assim viva, Esses pedaços de algodão rosa com que me vais alimentado. Nesse resgate donde me retiras dessa angústia de desgosto de vida em que me viciei. Nessa entrega desmesurada a quem não me queria nem para cantigas.

Contigo tento aprender que nessa ilha deserta não há caminho, e que não posso viver presa naquilo que já não existe, se é que realmente alguma vez existiu.

Esta é aquela altura em te deparas perante as minhas pequenas linhas, e te interrogas que mesmo quando tento escrever verde-mar/esperança as palavras continuam a sair pesadas/pesarosas. J

Mas sigo tentando!


Maria

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Guardo!



Presa nessa cadeira de rodas da vida aguardo com ansiedade a tua chegada. Recordo não sei se com dor, se com mágoa, se com saudade desses dias que já tive quase tudo. Tudo perguntas-me?

Sim tudo que é admirado e que leva a que os “outros” te respeitem e que te dediquem atenção.

Não sei se fui mais feliz nesses tempos de abundância de tudo ou de quase nada. Tive muita coisa mas agora olhando para trás, não vejo quase nada que realmente tenha semeado. Houve tempos idos que qualquer data que fosse digna de assinalar toda a gente ligava, ninguém queria ficar para último.

Agora o tempo corre lento e silencioso. Ainda te lembras quando eu era capaz de ajudar quem precisava? Ao menos nessas alturas essa ajuda alivia-me a dor, essa dor de criança de quem teve que regatear um carinho e um abraço.

O tempo encarregou-se de mutilar essa minha parte saudável e activa, aqui me plantou à beira do nada, apenas com uma esperança. Que chegues, me abraces, me atenues essa agonia de ainda ser gozada das minhas incapacidades.

Julgo que se esquecem da roleta viva que nunca pará e que lhes pode bater à porta, também nessas alturas em que cismo de mim, recordo-me sempre das tuas sábias palavras…

Se realmente gostassem de mim, gostariam independentemente da roupa que sou capaz de adquirir, da teimosia do meu corpo em não se mexer, e nesse abraço que ainda sou capaz de dar.


Sabes? Guardo esse abraço só para ti!

Maria

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Silêncios

Não alcançar saber ou sentir o que me dói mais, se o teu silêncio, se a minha certeza que era inabalável que jamais me deixarias cair. Nem por tricas nem dicas, arrufos, mal entendidos, quer a razão te assistisse ou não. Contava que no fim da linha estarias lá sempre.
Deixei-me embalar por esse murmúrio quente que se me entranhou na alma, no coração. Essa esperança de um regaço.
Sonhei com esse jardim verde-mar onde eu podia ser essa criança desgarrada que finalmente encontrou o seu recanto.
Falo desse amor de nome pomposo de incondicional. Hoje aqui no meio de tanta gente, percorro-me como uma projecção de slides, correm devagar, turvam-me os olhos, e sinto-me assim miseravelmente só. Tento sorrir nessa alegria tocada de bom vinho, boa comida. Mas dói-me essas ausências, essas tantas chapadas de luva branca ou o raio que as parta. Revejo meticulosamente o que nos poderia ter levado a esse silêncio pesado e triste.

Tenho medo, desse frio vagaroso que nos percorre a espinha Tento antever uma saída airosa, um projecto do nada, um simples apelo que o tempo retroceda e me conduza de novo a esse abraço fechado.
Perdi essa resistência de lutadora incansável, armada de heroína falhada que iria salvar, essa menina loira, de caracóis dourados, que se perdeu ao dar passos maiores que a perna. Desgastada de julgamentos fáceis, criticas anunciadas de que há muito se esperava o insucesso, porque o sucesso não se perdoa facilmente.
Encontro algum alento de quem pura e simplesmente mal me conhece mas me aceita como ser humano.
Mas ambos sabemos que as horas piores ainda estão para vir.
Adormecer sem esse embalo, sossegar essa criança que vai teimar em não dormir, nessas histórias e contos de amor em que a embalavas. Explicar-lhe que hoje não há sonho, não há essa esperança de amanha ser um dia melhor.
Maria

domingo, 9 de janeiro de 2011

Hold My Hand

Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.

Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,
não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.

O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,
a vida presente.

"Mãos Dadas" - Carlos Drummond de Andrade